Odemira. Pandemia escancarou feridas, mas casas continuam caras e superlotadas
Source: Diario de Noticias
Author: Diário De Notícias
A covid-19 descobriu uma realidade já conhecida: a chegada de milhares de imigrantes, para responder à proliferação de explorações agrícolas e à falta de mão-de-obra, sem condições para os acolher. Seis meses depois, o que mudou? Agora são menos.
Um quarto de 9 m2, uma cama de casal e um pequeno sofá, onde vivem dois adultos e duas crianças. É também sala, escritório e despensa, embora exista uma cozinha na casa que é partilhada por três famílias, em Almograve, no concelho de Odemira. Pagam 350 euros por mês cada uma, ou seja, 1050 euros por uma habitação com três quartos, num meio rural. Mas a oferta é pouca e a procura é muita, fazendo disparar os preços, o que se agravou nos últimos cinco anos com o grande fluxo da migração asiática. Nada mudou desde a cerca sanitária devido à covid-19, que apontou os holofotes para a aldeia.
Kaur é a mulher da família. Chegou da Índia há dois meses, prefere não dizer o primeiro nome nem aparecer nas fotos, teme que possa ter problemas. Ficamos pelo apelido, Kaur, o que as indianas da religião sikh usam e que significa "princesa". Os homens têm o título Singh, "leão". O marido está em Portugal há três anos, trabalha numa exploração de frutos vermelhos, trouxe a família ao abrigo do reagrupamento familiar: a mulher e os gémeos, de oito anos, que frequentam a escola. Não é fácil gerir o orçamento mensal.
"O meu marido ganha pouco, 700 euros por mês, metade é para a casa, o resto fica para a comida, roupa, sapatos, escola, é muito complicado", conta Kaur quando lhe perguntamos se mandam algum dinheiro para a Índia. "Fica cá tudo."
Dificuldade que não os faz arrepiar caminho no plano de imigração. "Gosto da terra, das pessoas, muito calmo, e podemos ter melhores condições do que na Índia. Também é melhor para os filhos."
A conversa foi em hindi, com tradução de Harpreet Singh, de 37 anos. Também é natural da Índia, chegou ao Porto há oito anos e um ano depois estava a viver em Almograve. Recorda que se contavam pelos dedos as pessoas da sua região. Muita coisa mudou, sobretudo a partir de 2016/2017, quando as ruas do Sudoeste Alentejano se encheram de cidadãos dos países indostânicos. "Mudou muito e no preço das casas nem se fala, é muito caro."
Fala em sítios com várias famílias, em residências que, no pico da colheita - entre março e junho -, chegam a alojar quatro pessoas por quarto, a 150 euros mensais por cama. "Não há casas e as pessoas têm que se sujeitar. Também não ganham muito, é complicado", explica Harpreet.
A Amandeep Kaur, a mulher, de 35 anos, juntou-se-lhe há dois. Com ela vieram os filhos, um rapaz agora com 16 anos e uma rapariga de 14. Estudam em Odemira, ele num curso profissional de mecânica, ela no 9.º ano. Chegaram dois anos depois da abertura do Harpreet Minimercado, uma mercearia que o marido comprou. Os clientes são alguns portugueses, mas sobretudo indianos e nepaleses. No verão, com a vinda dos veraneantes, o negócio aumenta substancialmente.
Vivem numa casa com dois quartos e que há quatro anos foi alugada por 450 euros. Hoje seria o dobro, assegura Harpreet. "Comprei um apartamento em Pegões [Montijo], três quartos, por 100 mil euros, aqui seriam 200 ou 300 mil. Quando tiver mais dinheiro, vendo a mercearia e vamos para lá." Isto apesar de se sentirem muito bem em Almograve. "A mulher e os filhos gostam muito, conheço toda a gente, os filhos aprendem muito bem o português, queremos ficar em Portugal."
O cão Gary é a mais nova aquisição da família e que os conterrâneos já adotaram. Entre eles Tirath Singh, 52 anos, que esteve pela primeira vez em Portugal (Lisboa) há 15. Regressou ao seu país, trabalhou noutras nações, até voltar há quatro anos, tantos quantos vive em Almograve. O mesmo tempo que Baljit Singh, de 28 anos: "Temos trabalho, bom clima e as pessoas são boas."
A religião, as tradições, os hábitos alimentares são os dos países de origem, conjugados com práticas locais. Como a comida portuguesa, com Harpreet a nomear a que considera melhor: "Tosta mista, pão, batata frita, frango e camarão."
Concelho cresceu só no litoral
A aldeia pertence à freguesia de Longueira/Almograve, a que mais cresceu no concelho em termos percentuais no Censos 2021. Passou de 1356 residentes para 2338, mais 72,4 %, pessoas que ali vivem há mais de seis meses. A maior freguesia é a de São Teotónio, 8694 residentes (mais 57,3 %). Segue-se Boavista dos Pinheiros em taxa de crescimento, passando para 1974, mais 20,9%. Vila Nova de Milfontes passou de 5031 para 5653 (mais 12,2%). Fora deste eixo no litoral, a população até diminuiu, o que é mais visível em Santa Clara-a-Velha, com 632 habitantes (menos 27,6%), Saboia, 921 (menos 20%) e Vale de Santiago, 822 (menos 21,5%).
É junto às explorações agrícolas que se nota o aumento substancial da população. Fala-se nos imigrantes, mas professores, técnicos de saúde, elementos das forças de autoridade, outros trabalhadores para ali deslocados, têm as mesmas dificuldades em encontrar casa a uma renda acessível.
A Secretaria de Estado da Habitação elaborou a Estratégia Local de Habitação, que, segundo o presidente da Câmara Municipal de Odemira, Hélio Guerreiro, "pretende resolver questões de primeiro direito para habitantes permanentes, pelo que não tem ligação a proveniências geográficas das pessoas que possam vir a beneficiar". Acrescenta que o objetivo do município "é criar uma resposta que possa criar soluções de habitação para 150 jovens e para responder às necessidades decorrentes da resolução do processo da área de fracionamento ilegal da propriedade rústica a norte de Vila Nova de Milfontes".
Em junho, o Conselho de Ministros aprovou uma resolução (n.º 69/2021) para agilizar a instalação de contentores para habitação nas explorações. Esta altera a legislação de 2019 sobre alojamentos temporários, criada para fazer face à falta de habitação. Os pedidos têm que ser feitos à autarquia, que tem 15 dias para decidir. Pede-se celeridade na análise "dos pedidos de instalação ou regularização dos alojamentos temporários, sob pena de deferimento tácito", o que é criticado pelas associações de imigrantes. "Se a autarquia não decidir nesse prazo, as empresas podem instalar os contentores sem que tenham as condições necessárias. E 15 dias é muito pouco para analisar os pedidos", protesta Alberto Matos, da Solidariedade Imigrante, em Beja.
Hélio Guerreiro informa que deram entrada "12 pedidos de instalações temporárias e estão todos em análise pela autarquia". Quanto ao cumprimento dos prazos, esclarece: "Incidem, na quase totalidade, sobre a regularização de situações. Os procedimentos estão a decorrer e contam com os contraditórios, pelo que estão nessa fase."
Análises que os produtores gostariam de ver mais adiantadas. Margarida Carvalho, da direção da Associação de Horticultores, Floricultores e Floricultores (AHSA), lamenta: "Infelizmente, os processos de instalação de alojamento temporário - não necessariamente contentores - estão ainda a decorrer. Dizemos infelizmente porque esta é uma solução urgente e mais imediata que qualquer outra e está a ser limitada por questões burocráticas, que, a nosso entender, nada acrescentam à valia que representa. O empenho das empresas e de quem orienta estes processos tem sido notável. O dinamismo e vontade de contribuir com soluções superou as expectativas."
A AHSA representa 30 empresas produtoras de frutas, hortícolas e plantas ornamentais nos concelhos de Odemira e Aljezur. Totalizam uma área de produção de cerca de 2500 hectares.
Covid-19 pôs aldeia no mapa
Apesar da praia, Almograve não fazia parte dos roteiros principais Não tem aldeamentos turísticos, vivia do aluguer de casas a particulares que ali passavam férias. Nos últimos anos, os imigrantes deram uso contínuo a muitas casas e alimentaram a especulação. A cerca sanitária decretada a 1 de maio e que se manteve até 12 desse mês pôs a terra no mapa mediático pelas piores razões: muitos casos de doentes de covid-19, trabalhadores migrantes que viviam sem condições e sem a garantia de cumprimento dos cuidados sanitários.
"Se não acontecesse a cerca, provavelmente teríamos mais gente, houve muitas pessoas que se foram embora antes de terem fechado as entradas e saídas. Souberam antes de mim o que ia acontecer. Por outro lado, provavelmente muitas vieram no verão por isso. Os restaurantes e o comércio estiveram sempre cheios", diz Maria Glória Pacheco, presidente da Junta de Freguesia de Longueira/Almograve. Queixa-se de não ter sido ouvida para a resolução do problema, juntando a sua crítica à de Dário Guerreiro, o presidente da Junta de Freguesia de São Teotónio, a outra freguesia do concelho que foi fechada (ver entrevista). Foram muitos dias nas televisões, rádios e jornais, também em reuniões ministeriais e concelhias, muito debate e sentença. O que resta, afinal?
"Não mudou nada. Não há habitação, as pessoas vivem nas mesmas condições, há sobrelotação. Fui a coordenadora do Censos e, sinceramente, também não vi aqui as más condições de habitação que foram reportadas. Vi sujidade, mas tem de ser quem lá mora a manter as casas limpas. Uma coisa é a falta de condições; outra é falta de asseio." Quanto à fiscalização e casas encerradas: "Não dei por nada, mas também ninguém nos diz nada", sublinha Maria da Glória.
Passados seis meses, as ruas das vilas do Sudoeste Alentejano têm menos imigrantes. A atenção mediática levou a que muitos fossem trabalhar para outras localidades, também há menos que fazer nesta altura do ano. É a época da apanha da azeitona, cultura praticamente inexistente no concelho. Dos 12 mil hectares de ocupação do Perímetro de Rega do Mira (89 % em Odemira), 7 mil são distribuídos da seguinte forma: 27% de culturas forrageiras (para animais), 22% de hortícolas diversas, 16% de pequenos frutos, 12% de culturas arvenses (cereais) e 11% de flores e plantas ornamentais.
A produção é estável durante todo o ano nas hortícolas e plantas ornamentais. Tem o pico da campanha dos pequenos frutos (vermelhos) entre abril e junho. Entre novembro e março as necessidades de mão de obra são menores.
Há muitos imigrantes que aproveitam para ir de férias às origens, como é o caso de Gian Pal, 38 anos. Falta um mês para passar o Natal em Kurukshetra, a sua cidade no Estado indiano de Haryana. Chegou a Almograve em 2015, considera-se um cidadão do mundo. Saiu da Índia em 2005, em direção a Singapura, seguiu-se Malásia, Tailândia, Quénia, Macau, Suíça e Alemanha.
"Conheço muitos países, a Índia é boa para estudar, pela cultura, mas não é boa para trabalhar. Quando cheguei a Odemira, não havia muita gente, havia casas livres, só existia um grande supermercado", conta. Mora num monte em Cavaleiro (São Teotónio), numa de duas casas geminadas, com um quarto, uma cozinha e casa de banho cada uma. A renda das duas são 800 euros mensais, chegando a lá viver sete pessoas. O pagamento é desculpado nos últimos meses devido à pandemia.
Gian casou em 2012, ainda viveu com a mulher no Quénia, onde comprava roupa para vender na Índia, mas a insegurança levou-os a regressar às origens. Uma pena, porque seria o país onde gostaria de viver. A mulher e a filha, de cinco anos, vivem na Índia. Ele espera ser chamado pelo SEF para entregar toda a papelada para juntar a família.
Fundou há um ano, com outro sócio, a Apelo Infinito, uma prestadora de serviços no ramo agrícola. Garante que o objetivo é dar melhores condições aos imigrantes do que os outros intermediários. "Vemos onde há trabalho, tratamos dos papéis, do transporte, apoiamos. Os outros recebem seis a sete euros à hora das empresas por trabalhador e pagam três ou quatro, nós pagamos cinco, só tiramos o necessário para as despesas e o serviço que prestamos."
Gian reconhece que o principal objetivo de quem vem de fora é aguentar dois anos para obter a autorização de residência. Depois, pode ser contratado pelas grandes empresas, mudar de profissão ou viajar para outro país. "As grandes empresas não tratam dos papéis, são as pequenas. Quando se tem papéis, é mais fácil ser contratado diretamente ou ir para Lisboa trabalhar na Uber Eats e Uber Taxi. Muitos também vão para o estrangeiro. Em Portugal os salários são baixos, não pagam ao dia 1, mas a 15, trabalha-se entre as 7h30 e as 16h30, faltam transportes."
Os ordenados de quem chega não vão além dos 700 euros, o que pode traduzir-se em menos de metade se tiverem de pagar à empresa subcontratada a casa, a comida, o transporte e outros serviços. Quem estabiliza, pode chegar aos 1200/1300 euros, com horas extra e prémios de produção.
A cerca sanitária prejudicou o negócio de Gian Pal, mas este realça que a situação dos migrantes está um pouco melhor, principalmente porque muitos se foram embora. "Foram para Lisboa e Porto, trabalhar nas obras, onde pagam melhor."
Quem ficou e, sobretudo nesta altura do ano, são os contratados todo o ano e não apenas sazonalmente. Como Mohammed Shopon, 30 anos, do Bangladesh, que está na G.O. Berry, uma das empresas com melhores referências junto dos imigrantes. Vive em São Teotónio há três anos.
"Estou muito bem", assegura, enquanto cumprimenta efusivamente Manuel Martins, dando-lhe a boa nova: "Vou ao Bangladesh, de férias." É o senhorio, muito satisfeito com o rendimento extra dos inquilinos imigrantes. "A casa é grande, dá para 10 pessoas. São boas pessoas, portam-se bem, limpos, impecáveis", comenta. Quando lhe perguntamos se tem a certeza se habitam apenas 10 pessoas, responde já em passo rápido. "Alugo a casa a um e ele é que mete lá os outros. Se estão 10 ou 15, não me interessa, desde que cumpram."
Shopon segue numa das ruas estreitas ladeada por casas brancas de São Teotónio com mais três conterrâneos: Mohammed Saiful, 32 anos, Mohamed Monirul, 33, e Ruhest Ahmed, 28. Os dois primeiros estão em Portugal há cinco anos, o último veio de Inglaterra há dois. Tenta encontrar um quarto na vila, já que mora na Zambujeira do Mar. "Queria ficar mais perto do trabalho. Apanho framboesas mas, nesta altura, arranjamos as estufas, cortamos as plantas. Estou a pagar 300 euros por um quarto que partilho com amigos, uma pessoa só não consegue. Há empresas que têm contentores, mas não chega para todos", lamenta Ruhest.
Muito do comércio local tem já donos estrangeiros, como a Best Barber Shop. Um dos cabeleireiros é Manjunder Jeet, 24 anos, que veio diretamente da Alemanha onde exercia a profissão que aprendeu onde nasceu, no Estado indiano do Punjab. "A barbearia abriu há um ano e há muito trabalho, está a correr bem. A maioria dos clientes são indianos, nepaleses, do Bangladesh e alguns paquistaneses, mas também temos outras nacionalidades. Novembro e dezembro são os meses mais fracos, as pessoas vão até aos seus países passar o Natal." Neste dia tem sentada na cadeira para aparar o corte Sara Sabino, 27 anos, natural de Minas Gerais, Brasil.
Mão de obra que não nasce cá
Os rostos mais velhos dos alentejanos têm sido substituídos por homens em idade adulta, que colmatam as necessidades de mão de obra não só no concelho como no país. Ganham também os locais. O discurso do Chega contra a imigração não tem aqui aceitação. Foi o partido menos votado em Odemira nas última eleições autárquicas, sobretudo nas freguesias de São Teotónio, Longueira/Almograve e Vila Nova de Milfontes.
"Se não fosse esta gente, o que seria? Não havia quem trabalhasse nas estufas, nos campos, e dão vida à terra", comenta José da Silva de Jesus, 72 anos, dono da Silva Relojoeiro. Vende e arranja relógios e eletrodomésticos, também pequenas coisas, como pilhas, que fazem sempre falta. "Não tenho concorrência, tenho muitos clientes imigrantes." Compram sobretudo relógios, acessórios domésticos, trazem as panelas elétricas onde cozem o arroz para arranjar. O negócio cresceu com estes novos clientes, que em geral são bons pagadores. "Há um grupo de indianos que devem ter aprendido com os portugueses, sempre a pedir descontos, para baixar o preço", brinca. Maria Francisca, 79 anos, é visita assídua, sempre com a cadelinha Meggy. Uma doméstica reformada, nascida e criada em São Teotónio. "Isto mudou muito e para melhor", diz.
A falta de mão-de-obra é uma constante. Com a cerca sanitária, os produtores queixaram-se de prejuízos por não terem quem colhesse os frutos e os legumes. "Além de produção que não foi colhida, houve operações que ficaram por fazer, o que comprometeu, em certa medida, a produção do ano. Não temos o total dos prejuízos, mas só na primeira semana de maio estimámos cerca de 6 milhões de euros", contabiliza Margarida Carvalho.
O pico do trabalho agrícola nesta altura do ano é a apanha da azeitona e há poucos olivais no concelho. À exceção de uma ou outra empresa, como a Sociedade de Azeites Parrinha, em Colos, na fronteira com o concelho de Ourique. Deve o nome à alcunha do bisavó de Pedro Loução, 29 anos, que dirige a empresa com o pai, José Loução, 56. Uma empresa industrial fundada em 1940, com moagem de ração para animais, farinha para a panificação e lagar de azeite. Nos anos 70 dedicaram-se ao azeite, têm olivais, mas a maior parte do negócio é na transformação da azeitona de pequenos proprietários. Em 1986 modernizaram e transformaram o lagar numa linha contínua de produção de azeite.
Pai, mãe, filho e filha são os funcionários permanentes, a que se juntam dois empregados nesta altura do ano, e é grande a dificuldade de contratação. "Não há pessoas, os jovens em Portugal querem ser todos youtubers e instagramers. Ofereço 800 euros por mês e não querem, preferem receber o subsídio de desemprego", critica Pedro Loução.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística, no terceiro trimestre de 2021 o concelho tinha uma taxa de desemprego inferior à nacional - 5,6% contra 6,1 %.
Há 20 anos, a Parrinha teve de recorrer à mão de obra estrangeira, nos anos do fluxo migratório da Europa de Leste. Contrataram Sergiy OnushehyK, um ucraniano de 49 anos que nunca mais deixou Portugal. É supervisor, mas ainda assim não tem um contrato anual e ganha menos de 750 euros mensais.
Sergiy trabalha cinco meses no lagar, depois na poda de árvores, limpeza das matas e extração de cortiça, entre outros. Nos períodos maios calmos vai à Ucrânia, onde vivem a mulher e a filha, que nunca quiseram vir para Portugal. "Têm lá trabalho, a minha filha é advogada, para que é que vinha?", justifica. Ele não quer outro país. "Gosto muito do que faço no lagar e no campo, vivo aqui a maior parte do ano e tenho tempo para estar no meu país."
Há três anos a família Loução recorreu a um nepalês, que também acabou por ficar em Colos, mas noutra empresa. Este ano conseguiram contratar um português. Nas épocas de trabalho mais intenso recorrem a empresas intermediárias.
73 alojamentos fiscalizados
Em finais de março/início de abril, com o número de casos covid-19 a aumentarem, estiveram proibidas durante 12 dias as entradas e saídas das freguesias de Longueira/Almograve e de São Teotónio. Seguiu-se um corrupio das autoridades: Segurança Social, GNR, Alto Comissariado das Migrações, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), Saúde Pública e Autoridade Tributária (AT), bombeiros, Cruz Vermelha Portuguesa e Câmara Municipal de Odemira. Andaram essencialmente em São Teotónio e em Almograve, menos em Vila Nova de Milfontes, as localidades próximas das explorações agrícolas.
As informações sobre o resultado desse acompanhamento têm sido escassas. A ACT não respondeu aos e-mails do DN e a Câmara de Odemira foi parca nas respostas. Vale o balanço feito no final de novembro por José Ribeiro, responsável do Comando Regional do Alentejo da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e coordenador da task force criada no concelho.
Fiscalizaram 73 alojamentos/domicílios de trabalhadores. Elaboraram 14 autos de notícia, na maioria dos casos por as casas não terem condições de habitabilidade: falta de salubridade ou sobrelotação. Também encontraram imigrantes a viver em espaços que não eram para habitação ou cuja utilização tinha sido alterada.
"Os imigrantes que estiveram no Parque Zmar vieram de casas que não reuniam condições. A fiscalização foi em maio e nessa altura é que fecharam casas. Entretanto temos vindo a fazer um acompanhamento agregado e mais social. Isso permitiu que as pessoas que viviam em alojamentos sem condições fossem realojados no Zmar e na Pousada da Juventude. E tem havido fiscalização nos locais de trabalho", diz ao DN o comandante, José Ribeiro.
Alojaram ao todo 110 imigrantes no Parque de Eco Turismo Zmar, os últimos dos quais saíram no dia 30 de setembro. A Pousada da Juventude de Almograve também recebeu pessoas, encontrando-se lá atualmente 16 cidadãos. "Vão sair quase todos nas próximas semanas", informa o presidente da Câmara Municipal de Odemira.
A Autoridade Tributária identificou 11 senhorios e subarrendatários"que cometeram ilegalidades e foram processados. Identificaram 113 irregularidades, sendo que 74 foram voluntariamente regularizadas e 39 estão por regularizar". Instauraram 17 contraordenações.
A Câmara Municipal de Odemira abriu 29 processos relativos à habitação, com um total de 17 contraordenações, a maioria relacionada com a "utilização em desconformidade com a licença, edifício irregular ou em situação irregular, edifício sem licença de utilização ou desconformidade com normas regulamentares da edificação".
José Ribeiro explica que agora é muito menor a azáfama. "O que estamos a fazer é o acompanhamento dos migrantes que ainda estão na Pousada da Juventude de Almograve. Quem tem feito um acompanhamento mais contínuo é a ACT."
A ACT levantou 1220 autos de noticia entre maio e novembro no concelho de Odemira, consequência das ações de fiscalização a 104 explorações agrícolas. Visitaram 200 empresas, entre agricultores, prestadores de serviços e empresas de trabalho temporário.